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segunda-feira, 30 de abril de 2012

Há um innuendo vocal próprio a desgraça
Do desencontro a franzir no sobrelábio
Ao esfarelamento da língua inábil
E que a toda expressão limiar devassa

E há qualquer intenção de quase um sintoma
Quando a palavra cessa ao fim da sentença
Que é uma nota cava a anunciar doença
E a sugestão negra do nosso idioma

Numa cega punção de evitar ver
Os olhos de a quem se empresta evidência
Toda um velho drama de reparação

A revelação vazia de saber
Por quê é claro não pedir-se licença
Pra partir em pedaços um coração

terça-feira, 24 de abril de 2012

Temos os olhos, como às bocas temos
                                                             sinais
Que aos sonhos vamos como os sonhos vemos
                                                              reais

Mas recostemos a um tempo de costas
                                                         despidas
Como um recorte das horas que gostas
                                                         compridas

Que temos bocas, como os olhos temos
                                                             iguais
E aos segredos somos, como seremos
                                                             rivais
Eu vi!
          e foi num passageiro clarão
a imagem destilada em mil vestígios

que Eu sei!
          e a saber minha dotação
natural, soube o sabor dos caprichos

que Eu sou!
           no embotamento da sensação
uma existência violada aos prestígios

que Eu quis!

quarta-feira, 11 de abril de 2012

hermenêutica de quando o real é deserto

o real não é um objeto, um atributo do qual
as coisas tomam posse; o real é um sujeito
no percurso do herói, eu acredito que
sou real, mas é o real que toma posse de mim
quando lhe apraz; a minha existência é vazada
e o real me penetra, como penetra um deserto
a desolação não é da natureza do real, mas o real
se traveste em desolação. o real usa a desolação
como um vestido; é do vestido ser inerte.

há uma autonomia anônima do real
nesse deserto
Creio que
existe beleza nas coisas
mas quando não consigo vê-la eu
me convenço de que há beleza em ver as coisas,
sem saber se são belas
e talvez essa seja a realidade final da beleza,
uma vagueza intrínseca à percepção
infinitamente real